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Alexandre Félix

ARTIGO: Tensões atrás das Grades Curriculares



JOVENS ATRÁS DAS "GRADES" CURRICULARES


É preciso repensar as chamadas grades a fim de incluir o debate sociológico sobre temáticas atuais que interessam sim aos jovens, principalmente, para aqueles que estão vivenciando uma etapa importante de preparação ao Ensino Superior que é o Ensino Médio.


MARCELINO (2000) e MARTINS (1988), estabeleceu-se uma reflexão metodológica sobre o lugar do ensino de Sociologia num momento em que a Sociedade Brasileira é atacada em todas as suas estruturas. Nisso, investiga-se como lidar, de forma resistente à desvalorização do ensino de Sociologia na BNCC com claras interferências nos aspectos de interdisciplinaridade das temáticas tratadas no arcabouço da Sociologia. Ao longo do trabalho foi possível constatar que a tarefa do professor é, em sua ação didática, a de contribuir para a manutenção do ensino de Sociologia como ferramenta de reflexão sobre o lugar do homem e da mulher na escola e na comunidade. O presente artigo traz em seu corpus teórico o resultado de reflexões pedagógicas acerca do trabalho docente na disciplina de Sociologia do Ensino Médio.


De acordo com Parecer do MEC,


Os conteúdos curriculares de sociologia apresentados no documento em foco possuem o propósito de permitir uma atitude reflexiva por parte dos alunos, propiciando-os a adquirir uma capacidade cognitiva para interrogar o sentido das diversas manifestações sociais da vida cotidiana que o cercam, Os temas selecionados buscam incentivar os estudantes a refletir sobre os diversos fragmentos do mundo social que desde tenra idade tem sido na maioria das vezes percebido e experimentado por eles como natural e evidente, atitude esta que o sociólogo Alfred Schutz denominava de “mundo aceito sem discussão”. Ao mesmo tempo, com muita propriedade, o texto salienta também que a grade curricular objetiva proporcionar aos estudantes a possibilidade de desnaturalizar a sua relação com a realidade social imediata, alargando a capacidade intelectual dos alunos do ensino médio de perscrutar a respeito de preconceitos, estereótipos e estigmas sociais que perpassam as múltiplas relações sociais nas quais eles se encontram inseridos. (BRASIL, 2016)


Sabe-se que no atual momento do país vive-se muitas crises que necessitam de intervenção da escola e estabeleceu-se uma reflexão metodológica sobre o ensino de Sociologia e para isso toma-se a temática da interdisciplinaridade entre Cidadania e Sociologia. Ao longo do trabalho foi possível constatar que a tarefa do professor é, em sua ação didática, contribuir para noções básicas de cidadania na escola e na comunidade.


Ainda de acordo com Parecer do MEC em sua proposta curricular para o ensino de Sociologia, evidencia-se no documento que “com o propósito de desenvolver atitudes cognitivas de estranhamento, desnaturalização e desfamiliarização da vida social nos estudantes”,


o texto relativo ao componente curricular da sociologia, salienta que durante os três anos de ensino serão trabalhados de forma articulada uma série de conceitos. Com relação a sociologia o texto ressalta que durante o processo de aprendizagem serão mobilizados determinadas categorias conceituais tais como: (i) fato social; (ii) interações e relações sociais; (iii) instituições sociais; (iv) divisão social do trabalho e coexistência de diferentes relações sociais de produção; (v) classe, status e estratificação social; (vi) poder; (vii) cidadania; (viii) trabalho; (ixi) formas de de conflito, solidariedade e de dominação (x) estruturas sociais; (xi) padrões de mobilidade social; (xi) representações sociais e culturais; (xii) produção de identidades sociais, políticas e culturais; (xii) movimentos sociais; (xiiii) formas de organização do Estado e de regimes de governo;(xiv) cultura de massa, consumo e cidadania; (xv) construção social de visões de mundo e de utopias, etc . (BRASIL, 2016)


Segundo o sociólogo norte-americano G. Smith Russel, “nove décimos de tudo o que você faz, diz, pensa, sente, desde que se levanta de manhã cedo até que vai para a cama dormir, você diz, faz, pensa, sente não como expressão própria, independente, mas em conformidade inconsciente e sem crítica com regras, regulamentos, hábitos grupais, padrões, códigos, estilos e sensações que existiam muito antes que você nascesse”.


O maior instrumento de socialização é o controle social, que pode assumir diversas formas. O olhar de reprovação dos pais quando a criança toma sopa fazendo barulho, as chacotas dos adolescentes se um deles aparece vestido de terno e gravata são exemplos de controle social.


O processo educativo, nesse sentido, deve ser responsável por levar os sujeitos envolvidos a perceberem sua importância na vida do outro, suas responsabilidades diante do mundo e as capacidades que deve desenvolver para exercitar essas práticas no decorrer da vida.

O principal objetivo do controle social é fazer com que cada indivíduo tenha o comportamento socialmente esperado. É esse controle que, por exemplo, nos leva a manter a cabeça descoberta, enquanto até algumas décadas atrás esse mesmo controle fazia com que a maioria das pessoas usasse chapéu.


Para a antropóloga norte-americana Ruth Benedict (1887-1948),


“a história da evolução de um indivíduo é, antes de mais nada, o relato de sua acomodação aos padrões e tradições vigentes em sua comunidade. Desde o momento em que ele nasce os costumes do grupo a que pertence moldam suas experiências e seu comportamento. As primeiras palavras de uma criança são necessariamente pronunciadas em uma língua determinada. Por isso mesmo, essa criança já é um produto da cultura em que vive. Ao tornar-se adulta, já esta suficientemente treinada para tomar parte nas atividades da comunidade, com seus hábitos e suas crenças”.


Ao fazer uma reflexão ou qualquer tipo de critica em relação ao ensino de sociologia no ensino médio, considero de estrema importância destacar dois aspectos primordiais acerca do tema, o primeiro é um breve apanhado histórico da disciplina, destacando os períodos em que ela esteve presente ou ausente no currículo escolar e tentar compreender os motivos de tantas idas e vindas da sociologia na realidade educacional brasileira. E o segundo diz respeito ao discurso utilizado como afirmador da disciplina na grade curricular do ensino do país que coloca a disciplina como sendo um instrumento dotado da capacidade de levar o individuo a melhor vivenciar a “cidadania”.


O objetivo geral desse trabalho é o introduzir o discente à compreensão da sociologia como modalidade específica de conhecimento da realidade social. Além deste, estabeleceu-se como objetivos específicos: fazer uma interlocução entre as abordagens sociológicas; motivar o discente à interrogação da realidade social e despertar inquietações no discente, para que ele questione seus valores e a realidade social.


Este trabalho se justifica na necessidade do professor sempre rever sua didática no ensino de Sociologia e por isso essa é uma pesquisa bibliográfica e de natureza essencialmente qualitativa.


REPENSANDO O ENSINO DE SOCIOLIGIA DE DOCUMENTOS CURRICULARES NACIONAIS


O Ensino Médio vem passando por grandes transformações e elas não são boas em sua maioria. O forte viés tecnicista adotado nas últimas propostas curriculares do MEC, obscurece um conjunto de reflexões onde a contribuição da escola é a de articular um projeto de educação comprometida com o desenvolvimento de capacidades que permitem intervir na realidade para transformá-la. Preconiza que o convívio escolar é um fator determinante para a aprendizagem de valores e atitudes. Deste modo, em meio a conteúdos formais, disciplinas obrigatórias dentre outras incumbências, é tarefa da comunidade escolar (principalmente do professor) contribuir para a formação de cidadãos para atuar e tornar a sociedade mais democrática, isto inclui fomentar-lhes a consciência dos seus direitos e deveres, para que apresentem postura crítica diante dos problemas sociais e engajamento na resolução dos mesmos.


A expressão ser cidadão não é contemporânea, tem origem na Grécia antiga, o significado exato da palavra é cidades, e tem em Aristóteles seu grande disseminador. Para ele, cidadão era toda pessoa dotada de direitos (mais na esfera política) e deveres com a incumbência de contribuir para a formação do governo, além de participar das assembleias onde se tomavam decisões que envolviam a coletividade.


A obrigatoriedade do ensino de Sociologia em todas as séries do ensino médio é recente. Ela foi garantida com a aprovação da Lei 11.684/08 (BRASIL, 2008), gerando a expectativa de profissionais da área de que a disciplina se consolide definitivamente no âmbito da escolarização brasileira, tal como as demais disciplinas já plenamente institucionalizadas, como a matemática, a língua portuguesa, a história, a química. Essa expectativa se deve, em parte, ao caráter intermitente da disciplina (HANDFAS, 2015; MORAES, 2003; SILVA, 2007) nos currículos escolares, condizente com a própria institucionalização da área de Ciências Sociais em nosso país. É possível apontar, em alguns momentos dessa história, certas correlações com os períodos democráticos ou não de nossos governos e a oferta da disciplina nos currículos.


O ensino de Sociologia, conforme já apresentado na primeira seção, ganhou destaque na nossa legislação educacional quando se percebeu a possibilidade de se realizar, através dele, alguns dos objetivos educacionais para os educandos do ensino médio prescritos nessa legislação. Contudo, os estudos sobre o ensino de Sociologia, ainda que estejam crescendo em ritmo acelerado, não se configuram como uma preocupação primária de alunos ou professores das graduações em Ciências Sociais, em sua grande maioria.


Segundo Anita Handfas et al. (2015):


embora as pesquisas na área de ensino de Sociologia não estejam tão restritas às faculdades de Educação, estando quase em igualdade nos programas de pós-graduação em Ciências Sociais, pouco se tem questionado sobre as reais condições de ensino de Sociologia na Educação Básica.


De acordo com os autores estudados, a desestabilização de uma teoria sociológica canônica não se restringe ao âmbito acadêmico dos estudos pós-coloniais. As facetas mais evidentes do contexto colonial em que autores considerados “clássicos” enunciaram suas teorias podem ser alvo dos questionamentos de estudantes de Ensino Médio ou curso pré-vestibular. O professor ou a professora que, por exemplo, abordar a "Lei dos Três Estágios" de Auguste Comte (edição de 1978) – conteúdo presente em cursos de introdução à Sociologia – pode ser indagado pelos seus interlocutores a respeito do evolucionismo e colonialismo presentes nessa “lei”, a qual estabelece o “estágio” social europeu industrial como fim teleológico da humanidade. A leitura em sala de aula de alguns trechos dos três autores tomados como "clássicos" – Durkheim, Weber e Marx – que faça referência às sociedades do "novo mundo" como “primitivas” pode ser foco dos questionamentos desses estudantes.


Vale acentuar que a produção das grandes narrativas sobre aqueles que foram construídos como o Outro do Ocidente tem a ver, de forma constituinte, com a produção da história das próprias nações colonizadoras. Catarina Gomes e Maria Paula Meneses (2011, p. 5) explicam que essas macro-narrativas, além de serem permeadas de distorções, produzem ainda uma espécie de “enfermidade” no imaginário coletivo sobre o passado, o presente e as possibilidades de futuro; silenciam as perspectivas, as narrativas, as experiências, as memórias dos actores que não falam a partir do e pelo centro que autoriza, sanciona, legitima e dissemina a mesma macronarrativa, minando [...] a própria possibilidade de compressão histórica do passado.


Mas, de que Sociologia estamos tratando contemporaneamente nas escolas públicas de Ensino Médio? Se, de um modo geral, dada a diversidade de experiências que pesquisadoras e pesquisadores vêm apontando, o ensino de Sociologia permanece ensinando os “clássicos” e seus grandes temas, é preciso descolonizar o ensino de Sociologia ou, para usarmos a expressão de Manuela Sanches (2005), é preciso deslocalizar essa Sociologia.


Segundo a Base Nacional Comum Curricular, no tocante à área de Ciências Humanas e Sociais Aplicadas onde estão integradas as disciplinas de Filosofia, Geografia, História e Sociologia, vemos uma proposta de aprendizagens muito confusas onde de um lado, o MEC fala em “ética como juízo de apreciação da conduta humana, necessária para o viver em sociedade” mas quando apresenta as habilidades para tal, insurge-se contra o ensino de Sociologia como se este não fosse de forma alguma importante na estutura da escoal, pois, segundo algumas diretrizes é “preciso que tal conhecimento seja prático, que revele sintonia com as reais necessidades de trabalho”. Fica claro o viés tecnicista que se dá a um conjunto de conhecimentos clássicos sobre a Sociedade na qual estamos inseridos.

De acordo com a BNCC, para o ensino de Sociologia, pensa-se,


no Ensino Médio, a ampliação e o aprofundamento dessas questões são possíveis porque, na passagem do Ensino Fundamental para o Ensino Médio, ocorre não somente uma ampliação significativa na capacidade cognitiva dos jovens, como também de seu repertório conceitual e de sua capacidade de articular informações e conhecimentos. O desenvolvimento das capacidades de observação, memória e abstração permite percepções mais acuradas da realidade e raciocínios mais complexos – com base em um número maior de variáveis –, além de um domínio maior sobre diferentes linguagens, o que favorece os processos de simbolização e de abstração. (MEC, p. 547, 2017)


Habilidades e competências são dois vocábulos que estão em voga e com dúbias interpretações e servem às mais terríveis veiculação de um forte desejo de retorno ao passado onde a Educação era apenas para formar mão-de-obra qualificada para o mercado de trabalho. Como o atual governo brasileiro é a expressão máxima do atraso, forja-se no discurso estatal para a Educação desse governo, de que se o Ensino Médio não forma jovens trabalhadores, então, esse “Ensino Médio não serve”.


CONSIDERAÇÕES FINAIS


Ao final desse trabalho, algumas reflexões ficam para o debate em sua continuidade: até que ponto a Sociologia enquanto disciplina no currículo do Ensino Médio deve intervir na formação de uma mentalidade crítica do aluno?


Dessa forma, a partir das contribuições dos autores é possível considerar que se buscamos um ensino aberto às contribuições da crítica pós-colonial devemos problematizar o que poderia ser uma explicação. O promissor para um ensino de Sociologia pós-colonial reside na possibilidade de releitura das obras culturais canônicas, com a pretensão de reinvestigar suas pressuposições.


Ou seja, podemos e devemos considerar que a Sociologia, assim como o saber de matriz europeia, toma como pressuposto a ideia moderna de indivíduo, entidade portadora de razão e sujeito de conhecimento.


Como professores de Sociologia fica claro que é urgente, portanto, pensarmos sobre as possibilidades de desracialização da produção de conhecimento, de deslocamento das representações subjetivas nos imaginários, de construção de novos sentidos, e possibilidades de identificação social, de circulação de conhecimentos produzidos nas beiradas, à medida que mais pessoas negras, pobres, gays e transexuais, indígenas, do campo, ribeirinhos, de assentamentos rurais se fazem presentes nas escolas de ensino médio e nas universidades. É com essas pessoas - não suas caricaturas - que o currículo de Sociologia vai ter de ser disputado, tensionado e construído.


REFERÊNCIAS


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DURKHEIM, E. O suicídio: estudo de sociologia. São Paulo: Martins Fontes, 2000. FANON, F. Pele negra, máscaras brancas. Rio de Janeiro: Fator, 1983.


GOMES, N. L. Indagações sobre currículo: diversidade e currículo. Brasília: Ministério da Educação– Secretaria de Educação Básica, 2007.


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NEVES, A. B. M. (2015). Sociologia no ensino médio: com que “roupa” ela vai? In: Handfas, A., Maçaira, J. P., & Fraga, A. B. (org.). Conhecimento escolar e ensino de sociologia: instituições, práticas e percepções (pp. 87-100). 1 ed. – Rio de Janeiro: 7letras.


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ROCHA, C. C. T. (2015). Saberes da Docência Aprendidos no PIBID: um estudo com futuros professores de sociologia. Jundiaí: Paco Editorial.


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SILVA, I. F. (2007). A sociologia no ensino médio: os desafios institucionais e epistemológicos para a consolidação da disciplina. Revista Cronos, 8(2), 403- 427. Recuperado em 05 abril, 2016, de http://www. periodicos.ufrn.br/cronos/article/view/1844

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